Desta vez quase esqueci esta data. Parece irreal mas já passaram vinte anos, mais de metade da minha vida e contra todas as previsões, aqui estou. Ainda estou, já sem a tenacidade inicial mas presente.
Como tudo poderia ter sido diferente, se tivesse ficado em casa naquele dia. Talvez seria um caminho menos penoso, mais inocente e menos amargo, talvez... muito talvez.
A partir daquele dia tudo passou a custar mais. Para as tarefas mais banais é necessário muito empenho e com o passar do tempo, cada vez mais. Tornei-me frio, fechado em mim, tornei mestre em esconder falhas, os receios, a enfrentar a vida de uma forma cada vez mais crítica, mais crítico com os outros e sobretudo comigo.
Também houve consequências positivas. Tornei-me mais aplicado, mais objectivo, testei os meus limites e hoje tenho real percepção das minhas capacidades. Sou decidido mas não sou o poço de força que proclamam. Escondo bem o quanto custa viver, o cansaço de sofrer constantemente, a batalha que é necessária para conseguir acompanhar os outros. Utilizo um sorriso como escudo, para disfarçar a dor que há em mim.
Por vezes, fechado em mim, na minha solidão, revolto-me com o destino. Queria uma folga, poder ser quem não me foi permitido. Poder viver ao invés de sobreviver, não tratar a dor por tu e ter uma casa a que pudesse chamar de lar. A minha família, que acolhe a minha chegada com carinho e afecto. Então, eis que chegam os primeiros raios de sol, dissolvendo o escuro da minha solidão e sou puxado novamente à realidade. A minha guerra solitária continua, não há tempo para sonhar, é vital haver empenho para almejar respirar.
Vinte anos passaram, vinte anos a batalhar, parabéns a mim, por vinte anos de sobrevivência.
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