The Real Johnny Bravo

Histórias de um livro chamado vida

Os olhos abriram lentamente na manhã fria ainda procurando o espaço e tempo onde se encontrava. Instintivamente aconchega-se ao edredão, numa mescal do frio que se sente e da ausência que se pressente. Deixa-se ficar deitado, dando corda ao raciocino que chega ao de leve imbuído em fotos antigas, revivendo imagens idas de um passado curto mas ao mesmo tempo distante, sem que haja lógica para tais pensamentos, instintivamente, puxa ainda mais o edredão contra o corpo.
Está frio, talvez seja do tempo, este cinzento que cobre os últimos dias, reavivando memórias condizentes com a sua cor. Imagens a preto e branco, que já não demonstram o calor de uma foto a cores. Enquanto vai deixando a inércia levar a melhor, na guerra do levantar, liga a televisão. Talvez o zapping, o desperte da nostalgia. Mais notícias sobre o tempo, desta vez ventos ciclónicos no continente e só de pensar que ainda há uma ida ao teatro ao anoitecer, torce-se o nariz. Não será possível ficar aqui aninhado no quente dos lençóis? Era bom mas há coisas a tratar e há que dar força aos amigos. Talvez no final volte-se a sentir o quente, no copo de uma bebida.
Mais uma batalha contra os lençóis ganha pela inércia, desta vez a vitória foi à justa e leva a mudar de posição, virado para a foto da cabeceira, o futuro. Também tu estás a cinzento, pensa, mas pelo menos vê-se o sorriso que irradia cor. Sorri de volta, é, foi mesmo do tempo. Drenou-se o que existia, secou por dentro até retirar toda a esperança e agora somente vislumbra-se lembranças que retornam a tempos. O futuro é a cores, não é um futuro de tonalidades intensas, de amarelos girassóis, é de um verde primaveril, equilibrado e ponderado. De sorrisos mil e olhares castanhos cintilantes, de um azul suave como a brisa que aviva a memória para o cheiro a jasmim.
É revigorante esta ausência do futuro, é a arma letal contra a inércia. Knock-out à primeira, levantar ao impulso de uma mola, os lençóis abandonados sem apelo, nem agravo. Um banho para despertar e seguir passivamente em direcção ao café. Vamos ler o que as notícias trazem hoje de bom, ao sabor de uma meia-de-leite e ao som do David Fonseca, que para cinzento já basta o tempo.