The Real Johnny Bravo

Histórias de um livro chamado vida

Já não há mais registos do passado, só memórias e essas, com o passar do tempo, vão-se tornar vagas ou como tão bem mencionou uma amiga há uns tempos, sugestivas. A memória sugere aquilo que queremos recordar, não guarda mágoa ou momentos menos felizes. Será dessa maneira que o passado será recordado. Difuso, longínquo e feito de bons momentos.
Hoje compreendi a ilusão que sempre foi a presença de um papel amarelo na carteira. Não significa esperança, não significa uma verdade. Significa que enganou-se no destinatário e veio fora de validade. Todas as demonstrações de um sentir inocente e puro, foram apagadas sem apelo nem agravo. Essas, a serem importantes, seriam mantidas com carinho e respeito pelo que se viveu mas ao invés morreram queimadas, como morrem girassóis a olhar para um sol abrasador e impiedoso. De igual forma tomei a liberdade de anúnciar a morte do papel amarelo e todas as outras recordações que ainda mantinha. Não teria nexo manter vivo o que nunca foi real e talvez o último passo do passado, seja o rasgar de um retrato que concerteza já não mora na sala, que qualifico como o seio de uma felicidade utópica.
É bom descobrir assim, cru e muito frio como os dias que hoje vivemos. Morre a esperança na praia, clarifica-se muito bem posições, aceita-se que ilusões não enchem um coração. Está na hora de seguir caminho e passarei a fazer o percurso de todos os dias, sem voltar a olhar para a mesma paragem, sem ansiar vislumbrar o vulto do passado. Amanhã, não irei sentar à janela, fecharei os olhos a ouvir a música do presente. Talvez desta forma a cicatriz feche para sempre. Quem sabe, talvez até deixe de ser um cicatriz e dilua-se com o tempo.
Vou fechar os olhos com a sensação que não sei dar mais, que sempre fui verdadeiro e leal. Ofereci tudo, fui o melhor amigo, companheiro e amante mas as vozes de fundo dos velhos do Restelo estiveram sempre a fazer ressonância e serão sempre defendidas como a entrega total nunca foi. O passado estava certo quando lembrava que magoamos quem mais gosta de nós e aí também eu tenho culpa no cartório, porque magoei deliberadamente o passado, quando este fez-me sofrer. Não soube ser maior, não soube ser benevolente, ataquei como forma de defesa e por isso peço perdão. Ninguém é perfeito, eu muito longe encontro-me disso mas talvez um dia o passado consiga perdoar os meus erros, assim como eu já relevei a dor que senti.
Desejo o melhor para o passado. Que consiga em dobro realizar o que acalento para mim mas acima de tudo, desejo que tenha mesmo a tal força aclamada aos quatro ventos para seguir em frente, da mesma forma como eu hoje encontrei ainda mais perseverança para atingir as minhas promessas ao vislumbrar que a minha existência, o meu sentir já se transformaram em cinzas. A primeira promessa está cumprida, a segunda e a terceira à porta batem. Outras promessas serão realizadas, outras palavras ditas mas para outro tempo e espaço, como diz o provérbio chinês: Há três coisas que jamais voltam. A flecha lançada, a palavra dita e a oportunidade perdida.
Não há rancor, não há mágoa, já não há nada, apenas a aceitação da verdade incondicional. Esperança nunca teve razão de existir, palavras de momentos não devem ser tomadas como verdades absolutas, os sonhos foram ilusões da minha responsabilidade e o presente que chama por mim, merece que lhe dê uma hipótese.

Contagem Ao Segundo